Funciona mais ou menos como despedida o festival que a chef carioca Flávia Quaresma está comandando com o jovem chef mineiro Henrique Gilberto, esta semana, no Vecchio Sogno. Explico: ela revelou ontem que está para fechar as portas do Carême, restaurante que abriu há 10 anos no Rio de Janeiro. Quem quiser sentir o gostinho do que era a casa terá última oportunidade hoje à noite, quando termina o festival.
E que gostinho! Na primeira noite, ontem, Flávia e Henrique (que trabalhou com ela no Carême por dois anos) apresentaram criativo menu de seis etapas. Começou com ótimo arroz basmati com coco queimado e camarão grelhado (sem evidências da pimenta anunciada por Flávia e um pouco salgado para o meu gosto). Na sequência, foie gras grelhado, compota de goiaba (cadê o alecrim que estava no cardápio?), sablé de parmesão e redução de pato. Na boca, a mistura dos três primeiros elementos ficou excelente. A redução de pato, a meu ver, acrescenta pouco ao prato. Mas, absolutamente, não o compromete.
Primeiro prato: vermelho grelhado, ragu de canjica, castanhas de caju, taioba refogada, espuma de bouillabaisse, um toque de molho de pimenta biquinho e outro de aïoli. Confesso que quando vi o cardápio, temi pelo equilíbrio do prato em função da quantidade de elementos presentes. Mas funcionou bem - e muito. O gostoso ragu de canjica (grãos de milho branco envolvidos em creme denso, na verdade) fez as vezes de risoto e combinou muito bem com as castanhas de caju.
O segundo prato superou as expectativas criadas pelo primeiro. Flávia e Henrique elaboraram uma verdadeira montanha russa de sensações: pernil de cordeiro (dividido em duas partes; uma delas em crosta de amendoim), canjiquinha com um maravilhoso quiabo defumado e suas bolinhas, molho de cacau com pimenta guajillo e um único tomate cereja assado. O ótimo molho, inspirado no clássico mole poblano do México, equilibra amargor, doçura e ardor, embora a pimenta pudesse ter sido usada em dose pouco maior. O impressionante efeito defumado do quiabo foi conseguido por... uma panela fechada e cheia de serragem! Foi o próprio anfitrião, Ivo Faria, quem imaginou isso. Nada como mentes criativas trabalhando juntas!
A pré-sobremesa agradou: panna cotta de queijo canastra com compota de caqui (cadê o capim limão?). A sobremesa propriamente dita - bolinho de chocolate com maracujá, crocante de cacau e coulis de frutas vermelhas - não causou maiores sensações. Desculpem, mas a pilha da máquina acabou bem na hora em que a primeira entrada chegou à mesa! Falha nossa! Prometo que isso não se repetirá semana que vem, no festival do Claude Troisgros.
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