terça-feira, 8 de junho de 2010

A saga do pão de queijo gaúcho



Mês passado escrevi aqui no blog sobre um concurso de pão de queijo do qual fui jurado. Minha receita favorita não foi a vencedora, mas fiz questão de publicá-la no mesmo post. Gabriel, velho amigo que hoje está em Porto Alegre, viu a receita e, tomado pela saudade de sua Minas Gerais natal, se lançou à aventura de reproduzi-la na terra do churrasco e do chimarrão. O relato dele é delicioso. Vejam:


Dudu,

antes de contar a saga do pão de queijo, vou comentar três curiosidades a respeito do mercado de pão de queijo por aqui.

Primeira: certa vez, ano passado, fui tomar cerveja em um boteco e vi "bolinha de queijo" no cardápio. Pedi para experimentar. Esperava um bolinho de queijo desses tipo bolinho de mandioca ou de batata... Quando chegou à mesa, fiquei surpreso com os pães de queijo servidos em uma travessa de alumínio com palitos e molhos (catchup, mostarda e maionese) em potinhos.

Segunda: as marcas Forno de Minas e São Geraldo são facilmente encontradas por aqui no supermercado Zaffari. No Nacional (segunda maior rede) só tem umas marcas desconhecidas pra gente e que não são boas. O melhorzinho é o da marca Nacional, mas que não é lá grandes coisas.

Terceira: em padarias e lanchonetes (ou melhor, lancherias, usando o jargão local), pão de queijo é tratado como salgado. Salgado: tipo enroladinho de salsicha, pastel assado, esses salgados... Você pede, o cara põe num pratinho, esquenta no microondas e serve. Não precisa nem dizer que fica horrível, né!? Nesses lugares, não é tão comum assim encontrar pão de queijo (mas também não é muito difícil...). Em geral, a oferta de salgados aqui é fraca. Coxinha, por exemplo, é uma coisa que eu acho que nunca vi por aqui...

Bom, minha namorada adora pão de queijo e quando mostrei sua receita pra ela, nos empolgamos e resolvemos experimentar.

Primeiro problema: encontrar o queijo!

Em Porto Alegre, estava acontecendo a feira Brasil Rural Contemporâneo (patrocinada pelo governo federal), onde expositores do país inteiro vendiam produtos rurais típicos de suas regiões. Havia um stand de queijo canastra! Fiquei muito feliz quando avistei, mas o tamanho da felicidade foi o tamanho da decepção quando o vendedor disse que não tinha mais nenhum queijo! Todos esgotados no segundo dia de feira! Pra você ter ideia de como é difícil achar isso por aqui.

Perto dali, fomos ao Mercado Público, lugar mais propício para encontrar isso. O único queijo minas que achamos estava embalado a vácuo e, segundo o vendedor, era meia cura. Não tinha nada a ver com nosso canastra, mas o jeito era arriscar com esse mesmo. Já o parmesão, encontramos uma peça deliciosa no mesmo lugar.

Ralei os queijos e reservei, como diz a receita. Misturei a fécula com o polvilho azedo (quase confundi com o doce, mas não vacilei!) e deixei na bacia.



Agora começa o drama. A precisão da receita! O pacote de fécula de mandioca tinha apenas 500g, mas a receita mandava colocar 600g. Fazer o quê, né? Vamos no improviso com 100g a menos e ver no quê dá. Para minha namorada, a receita deve servir apenas como uma baliza, mas, para mim, ela deveria ser seguida à risca. Isso gerou um drama danado, pois ela não conseguia ficar na cozinha vendo meu esforço em calcular (no olhômetro) a quantidade de margarina para colocar na receita.

Segundo problema: acertar as medidas.

Em casa não tínhamos balança com precisão de gramas, então tivemos que improvisar. Para calcular a quantidade de margarina, tive que dividir com o dedo o pote de margarina mais ou menos na metade e, depois, na metade da metade. 1/4 de 500g (total do pote) daria 125g. A receita pede 120g, então, no olhômetro, calculei que um dedo de margarina seria suficiente. Só que a margarina não estava distribuída homogeneamente no pote, então tive que passar a faca para nivelar a pasta e a partir daí tirar a medida de um dedo. Minha namorada quase me bateu!

A quantidade de sal foi outro problema. Para ela, uma colher de sopa era o máximo que poderia colocar. A irmã dela que é farmacêutica disse que uma colher de sopa de sal tem uns 10g, então, seguindo a instrução dela, coloquei 3 colheres de sopa. Os ovos. A receita pede 180g. Calculei pela embalagem que cada ovo tem 55g. Simples. Usei três e pronto. Depois coloquei as claras de dois ovos e imaginei que ali devia ter os 60g exigidos. O leite e o óleo foram fáceis, pois tínhamos um pote com medida de volume. Para saber quanto usar de polvilho e queijo, fui também no olhômetro, dividindo a embalagem em partes iguais e usando até a quantidade da receita. Agora, quando a minha namorada me viu tentando calcular 0,75g de salsinha e 0,75g de orégano (imaginamos que 1,5g era o total dos dois) ela perdeu a paciência e disse para eu continuar sozinho. Ela já estava achando um absurdo minha tentativa de chegar o mais perto possível da receita.


Terceiro problema: a batedeira.

Depois de misturar o leite fervido com os outros ingredientes no polvilho, aquilo virou uma massa grossa e um pouco dura. A nossa batedeira não tinha a ponta tipo gancho. Ela jamais bateria aquela massa. O jeito foi meter a mão na massa e misturar manualmente. Depois de acrescentar os ovos a massa ficou mais mole, mas ficou muito grudenta! Parecia que aquilo nunca mais iria sair das minhas mãos. Misturei bastante, até doer os dedos. A massa ainda estava muito grudenta e a essa altura já estávamos descrentes. Foi um momento de desilusão. Parecia que não ia ficar bom, parecia que a massa não estava dando certo, mas a gente resolveu que iria assar aquilo para ver o que saía. A massa tava muito mole e assim não dava para enrolar bolinhas. Com a colher, fomos separando pequenas porções e jogando direto no queijo ralado com as ervas. Essa massa mole a gente colocou direto na fôrma untada com margarina e levamos ao forno preaquecido a 240 graus.


Depois de cerca de 20 minutos, o resultado surpreendente! Os pães de queijo cresceram e douraram! Pensamos: pelo menos bonitos, eles ficaram!


Depois de comer o primeiro não resistimos e assamos mais uma fornada! Pedi a opinião sincera de cada um dos que experimentaram. Chegamos a um ponto comum: estava um pouco salgado demais. As ervas também desapareceram. Pouco deu para perceber o sabor delas, embora pudéssemos vê-las. Para mim, o gosto do queijo também poderia ser mais acentuado. Acho que por causa do nosso queijo minas embalado. O gosto desse queijo era mais parecido com o de uma muçarela do que com o de um canastra, que é forte e marcante. Como resultado final, todos aprovaram o pão de queijo e gostaram muito! Ficou muito bom!


Levamos mais de três horas desde o início do processo de desembalar os ingredientes até dar a primeira mordida, mas o resultado final foi muito satisfatório e achamos que valeu a pena. Com o sorriso de volta ao rosto, minha namorada aprovou a receita e levou uns pãezinhos de queijo para a tia dela experimentar.

É isso, Mestre! Valeu a experiência do domingo cedo.

Abraços,

Gabriel

10 comentários:

  1. o pior de tudo é "pães de queijo servidos em uma travessa de alumínio com palitos e molhos (catchup, mostarda e maionese)". nossa mãe!

    Dimas

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  2. Pois é, Dimas. Eu, mineiro, era recém-chegado a Porto Alegre e aquilo me chocou. Depois de conhecer a cidade um pouco melhor, logo deu para perceber que aquele foi um caso isolado... (mas ainda assim bizarro).

    O melhor pão de queijo que já comi por aqui é vendido congelado e fabricado pela Suavità, uma pequena indústria alimentícia da cidade de Antônio Prado - RS. Olha, esse é bom mesmo! Deixa essas marcas tradicionais de congelados no chinelo!

    Grande Mestre, que legal ver o texto aqui no blog! Olha, cozinha no improviso não é fácil! Fica pior ainda quando executada por um cozinheiro bisonho. Mas, no final das contas, o resultado foi ótimo e nos divertimos com a experiência. Graças ao seu blog!

    Abraços,
    Gabriel

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  3. Caro Eduardo,
    Corajoso seu amigo, hein?
    Uma aventura fazer essa quitanda.
    Principalmente no Rio Grande, tchê!
    E por falar em pão de queijo gaúcho...
    Fui na FOGO NO CHÃO um dia desses.
    Aproveitei o desconto de 15% do EM.
    (Válido no mês de maio, eu acho).
    Lá, provei o pão de queijo deles.
    Sei que tem nada a ver o que fiz.
    Mas fiquei curioso em conhecê-lo.
    Achei-o sem graça demais da conta.
    Daí um "bombacha" me explicou isso.
    Disse que é feito para churrascaria.
    Bem leve para não encher o comensal.
    Você crê nisso?
    Abraços,
    MARCELO BRANDÃO

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  4. Ei Dú,

    Achei muito legal o Pão de Queijo gaucho. A Paula deve se lembrar da saudade que sentimos do pão de queijo na Bolívia. No aeroporto achamos uma "Cafeteria Brasil" e pedimos PÃO DE QUEIJO!!! Não tinha nem algo parecido.
    Agora: nada melhor que o pão de queijo do Verdemar, né?

    Bjos
    Taty

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  5. Oi Eduardo!
    Morei dois anos no sul e realmente os nossos queijos por lá não estão bem representados, nem são fáceis de encontrar. Passei vontade naquele tempo, viu? E vendo essas belezuras no post antigo de quando foi jurado, fui correndo pra cozinha testar... que delícia! até que enfim uma receita muito boa de pão de queijo legítimo! Obrigada!
    Abraço,
    Mari

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  6. Dimas, é realmente de doer imaginar essa cena...

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  7. Gabriel,

    cozinha é isso: é treino (já dizia Paulo de Oliveira, do Larica Total), é instinto, é conhecimento, é prazer. É uma diversão ao alcance de qualquer um. Muito obrigado pelo saboroso relato e continue na batalha!

    Abraços.

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  8. Marcelo,

    acredito neles. São sérios e fazem um trabalho de primeira aqui em BH. Veja o bufê deles: também é pequeno para não competir com o produto principal, que é a carne. Faz sentido, concorda?

    Abraços.

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  9. Oi, Taty!

    Sim, o do Verdemar é bom. Gosto muito do pão de queijo da Padaria Veneza também. Já experimentou?

    Beijos.

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  10. Oi, Mari.

    Que alegria saber que a receita já foi testada por dois leitores! Deu certo, então?

    Abraços.

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