Escrevendo agora há pouco sobre os chefs que vieram e virão ao restaurante Dádiva, me lembrei de que todos chegaram/chegarão ao Brasil contratados pelo mesma pessoa: o consultor gastronômico Roberto Jardim. É ele quem contrata boa parte dos chefs estrangeiros que cozinham no Brasil atualmente - muitos deles estrelados pelo Guia Michelin. A relação dele com eventos mineiros da área começou ano passado, no Festival de Gastronomia de Tiradentes. Na edição do evento deste ano também foi ele o responsável pela vinda da maioria dos chefs de fora. Ao que tudo indica, vai continuar trazendo gente estrelada para cá.
Capovilla/Divulgação
Por isso, aproveito para publicar aqui novamente a entrevista que fiz com ele ano passado, à ocasião da 11ª edição do Festival de Gastronomia de Tiradentes, para o caderno Divirta-se do jornal Estado de Minas:
Cachês astronômicos, humor imprevisível, passagens de primeira classe, bebedeiras, noitadas com mulheres. Parece relato de visita de astro do rock em turnê pelo mundo, mas não é. Acredite se quiser: esse é o retrato não muito raro do que é a vinda de um chef aclamado no exterior ao Brasil. Lidar com desejos estranhos e imposições dignas de artistas faz parte do dia-a-dia de quem contrata essas estrelas do universo gastronômico. Haja jogo de cintura. Quem conta é consultor gastronômico Roberto Jardim, que há 12 anos traz para o Brasil e capitais sul-americanas principalmente chefs estrelados pelo renomado guia Michelin. Para o Festival de Gastronomia de Tiradentes, “escalou” Kazuto Matsusaka, Pierre Sauvaget, Patrick Gauthier, Christian Le Squer e Benedetto Bartolotta.
Contratar um grande chef é como contratar um artista?
É parecido. É um trabalho complicado. Tem que ter paciência em alguns casos, como o do chef espanhol que foi todos os dias ao salão depois do jantar, menos no último, quando o embaixador da Espanha estava presente. Foi uma grosseria. Insisti muito e ele disse que no restaurante dele, em Madrid, ele recebia o pei. Embaixador era pouca coisa para ele. Ano passado, voltou ao Brasil para dar um curso. No contrato, omitiram o tema da aula e ele chegou para falar sobre “Como ser um grande chef como eu”.
Quais são os critérios para escolher chefs para festivais?
Primeiro, o boca-a-boca. Pergunto aos chefs quem me recomendariam. Depois, visito o local. Normalmente, não me identifico. Se gostar da comida, só depois de pedir a conta vou falar com o chef. Trabalho eventualmente com chefs sem estrelas, mas desde que trabalhem num restaurante ou hotel conhecido. A mídia gosta disso. Também me previno com opiniões de chefs muito amigos, que são “consultores de humor de chefs franceses”.
Que tipo de exigências eles fazem?
Quase todos querem suíte, querem espaço. E querem jantar nos melhores restaurantes. Quando estão aqui, as despesas vão lá em cima. Nem sempre tenho cortesias. Também controlo um pouco as bebidas. Um deles me deu um estouro de mais de R$ 2 mil em dois dias de champanhe. Saiu com as gatas e ainda bem que não mandou a conta delas. Pedem dois ou três dias a mais, para ficar de férias no Rio de Janeiro. Um deles pediu para ficar três dias em Copacabana ou Ipanema, acompanhado pela mulher, olhando para os traseiros das mulheres brasileiras. Além disso, alguns exigem viajar em primeira classe. Hoje é muito difícil trazer um chef em classe turística.
Quanto cobram os chefs estrelados?
Dentro do cartel de chefs três estrelas, há quem cobre 5 mil euros por dia de trabalho. Outros chegam a cobrar 15 mil euros. Ferran Adrià não pode vir para um festival porque depende de um laboratório que está anexado à sua cozinha. No Brasil, não temos nada que se compare, nem de perto, a cozinha que ele tem. O custo para trazê-lo e montar essa estrutura seria inviável. Assim como Pierre Gagnaire, ele deve cobrar em torno de 15 mil euros por dia.
Os chefs sentem receio em vir trabalhar aqui?
Muitos têm medo de se ausentar de Paris. Os três estrelas, sobretudo, só querem sair de quando fecham o restaurante, nas férias de agosto. Por isso tenho muitos eventos nesse mês. Acham que se saírem, um fiscal do guia Michelin pode chegar e lhes complicar a vida. Às vezes, têm receio de não ter equipamentos e ingredientes aos quais estão acostumados. Nossa manteiga, por exemplo, tem muito mais água que a européia. E só usam chocolate belga. Há chefs que praticamente nem tocam em pratos na cozinha. Trazem ajudantes, ficam olhando e, no final, provam para ver se há necessidade de fazer alguma correção. Mas há estrelados que até cortam cebola.
Qual é o melhor mercado para esses chefs?
O Japão. Já tenho chefs contratados para ano que vem e para 2010, apesar de nem saber ainda onde vão cozinhar. Se eu não contratar agora, os japoneses contratam na minha frente. Contratam um, dois anos antes. Passei a usar o critério deles, para me garantir. Hoje, posso fazer isso tranquilamente, pois tenho patrocinadores programados. Atualmente, sou quem mais contrata chefs estrelados pelo guia Michelin. Trago ao Brasil entre 25 e 28 chefs por ano.
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