Pois bem. Recebi a Larousse da Cerveja (Larousse do Brasil, R$ 119, 360 páginas). Gostei muito e acredito que se tornará a principal fonte de consulta para o público cervejeiro no país. Tanto pela qualidade do material, quanto pelo "fator inércia", ou seja, a tradição da editora em obras de referência. A matéria sairá em breve no caderno EM Cultura do jornal Estado de Minas. Como de costume, segue a entrevista com o autor. Com a palavra, Ronaldo Morado:
Conte como esse livro surgiu? A ideia foi sua? Como chegou à Larousse?
Sempre fui um curioso sobre o assunto; aos poucos me tornei um estudioso. Nos anos 90 era um daqueles executivos que viajam muito. Em cada cidade ou país, eu procurava as livrarias em busca de fontes de informação sobre a cerveja. Com uma bagagem inicial e incentivado pelso amigos me arrisquei a dar algumas palestras sobre o tema. A receptividade foi ótima, o que me incentivou a escrever uma apostila que se tornou o embrião do livro. Mais tarde, em 2003, constatando a escassez de livros sobre o tema, resolvi transformar a apostila em livro e comecei a me aprofundar mais ainda. Essa primeira versão do livro ficou pronta em meados de 2007. Procurei editoras interessadas e a Larousse do Brasil (3ª a ser procurada) imediatamente se prontificou. A partir de então foram 6 meses de negociação; daí surgiu a idéia de que o livro fosse o Larousse da Cerveja – obra de referencia. Isso exigiu de mim mais trabalho, porque um livro como esse precisa oferecer informações seguras, embasadas, checadas. Desde então foram quase 18 meses de muito trabalho até a obra final.
O livro poderá ser publicado em outros países? Há planos da editora quanto a isso?
Sim, o livro poderá ser publicado em outros países, embora isso não seja muito comum – um livro brasileiro ser traduzido para outros mercados. Mas acho que há mercado para tanto e a Larousse é uma grande Editora de nível mundial com penetração e influencia internacional.
Por que existem tão poucos livros sobre cerveja num país tão consumidor da bebida quanto o Brasil? A situação desse tipo de bibliografia é semelhante no restante do mundo?
Primeiro um esclarecimento: o brasileiro não é um grande consumidor de cerveja. A unidade de medida nesse caso é o consumo per capita. Bebemos cerca de 50 litros per capita/ano e a Republica Checa 160 litros per capita/ano. Estamos entre os 30º e 35º do ranking. Até a Venezuela está na nossa frente, em 9º lugar com cerca de 90 litros per capita/ano. Com relação à escassez de bibliografia sobre o assunto, infelizmente, é um fenômeno mundial. São muito poucos livros sobre o assunto em qualquer país, o que é facilmente observável nas livrarias; basta comparar com as prateleiras de livros sobre vinho.
A relação que os brasileiros estabelecem com a cerveja é diferente da de consumidores de outros países?
A relação dos consumidores de cerveja com a bebida é semelhante em qualquer parte do mundo. Cerveja é a bebida da celebração e confraternização, por excelência. O vinho, por exemplo, sempre teve uma conotação religiosa e/ou cerimoniosa, quase sempre ligado a rituais, inclusive os gastronômicos. Já a cerveja, considerada alimento durante 95% de sua história, ocupou espaços nas festas, nos churrascos, nas comemorações e sempre ligada a grupos de pessoas reunidas em torno de algum motivo de festividade ou encontro – em qualquer parte do mundo. Esse é o fenômeno antropológico ao redor da cerveja que é considerada um lubrificante social.
Vinho X cerveja. Quais são as peculiaridades, vantagens e desvantagens na harmonização com comida?
Harmonizar bebidas com comidas é uma arte e ao mesmo tempo uma questão muito pessoal. Raríssimos seres humanos são capazes de perceber todos os aromas e sabores. É uma capacidade mais do que uma habilidade, embora seja possível aprende-la e desenvolve-la. O vinho tem uma longa história de convivência com a gastronomia. Já a cerveja, que durante tanto tempo foi considerada alimento básico, presente na dieta familiar desde o desjejum, não ocupou as sofisticadas mesas como acompanhante culinário. Mas o paradoxo é que a cerveja oferece muito mais opções para harmonizações do que o vinho. São 81 estilos de cerveja, cada um com suas peculiaridades excêntricas e individuais. Em cada um desses estilos temos inúmeras variáveis a manipular : malte, lúpulo e levedura. Sem complicar muito, podemos variar a torrefação do malte, responsável pela cor, aroma e sabor; o lúpulo pelo aroma e pelo amargor e a levedura pelo aroma, carbonatação e sabor. O mestre cervejeiro pode trabalhar cada um desses ingredientes para produzir sua bebida de maneira única. Por uma questão aritmética as possibilidades são muitas quase a chance de repetir as mesmas 6 dezenas na mega sena.
Os cervejeiros se tornarão chatos como os enochatos?
Não acredito. Os cervejeiros são pessoas alegres em geral, pouco afeitas e cerimônias e rituais. Preferem “jogar conversa fora” do que desfilar conhecimentos.
Os microcervejeiros incomodam as grandes cervejarias ou são universos que não se tocam?
Acho que as microcervejarias incomodam os distribuidores de cerveja locais e regionais, aqueles que estão brigando pelo ponto de venda. A briga das grandes cervejarias é entre elas mesmo.
Como explica a recente febre de homebrewing em BH?
É um fenômeno maravilhoso que cresce rapidamente no Brasil todo. Acho que a evolução sensorial das pessoas tem sido notável nas ultimas décadas. Exemplos disso são os modismos de “homens na cozinha”, a proliferação de cursos de culinária, cursos sobre vinhos etc. O fabricar a cerveja em casa é parte dessa “ onda”. Mas é uma atividade interessante também porque, em geral, envolve grupos de amigos ajudando na formulação etc, o que é típico da cultura cervejeira. Um fator que muito ajuda esse movimento é a disponibilidade da matéria prima, o que não era possível décadas atrás. Já temos associações estaduais de cervejeiros caseiros – RJ, SP, SC, RS etc... e em Minas Gerais a ACERVA Mineira. O fato de Belo Horizonte ter se tornado uma dos principais focos de cervejeiros caseiros do Brasil é conseqüência da tradição do belorizontino, que já é acostumado à bebida por natureza. Não somos a capital dos bares ? Não criamos a “comidadibuteco” ? Criamos a CONFECE (confraria Feminina da Cerveja), existem mais de oito microcervejarias na RMBH e agora temos o autor do Larousse da Cerveja – natural.
Que cenário você consegue projetar para o universo da cerveja no Brasil nos próximos anos?
Está em curso um movimento muito interessante e importante no Brasil atualmente : a disseminação da cultura cervejeira. A expansão das microcervejarias por todo o país (de norte a sul); o crescimento do movimento dos cervejeiros caseiros (Acervas); a disseminação de maiores informações sobre a bebida; o aumento das exigências por parte dos consumidores; a consequente oferta de maior variedade de produtos por parte dos fabricantes. Todos ganhamos.
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Há 11 horas
Oi Dudu!
ResponderExcluirBom, de cerveja eu não entendo, mas já que você falou dos enochatos, outro dia li uma perspectiva interessante sobre isso: "os anti-enochatos são tão chatos quanto os enochatos". Hoje ninguém sabe o limite de cada um.
Abs,
Gui
Gui, te confesso que eu sempre pensei nisso! Acho os enochatos realmente uns chatos, mas acredito que cada um tem a sua maneira de sentir prazer com a experiência do vinho e ela deve ser respeitada. Nesse sentido, o rótulo enochato se transforma em coisa dita por chato, concorda? O que me desagrada é ver um condenando o outro. Cada um que tome vinho do jeito que quiser, sem ficar reparando no outro ou achando que se for diferente é feio, errado, inculto ou pedante! Viva as diferenças!
ResponderExcluirAbraços.
Exatamente!
ResponderExcluirIsso vale para tudo na vida, não só para os vinhos. Se o cara sabe diferenciar um malbec de um pinot noir ele não é um enochato. Assim como um cara que sabe diferenciar uma cerveja ale de uma larger não deve ser considerado chato.
Seu entrevistado, de certa forma, foi tendencioso para a preferência dele, como se só os cervejeiros fossem alegres e conversassem sobre outros assuntos...
Infelizmente, todo preconceito e distância que as pessoas tem do vinho vem dos enochatos.
E, completando sua frase, viva o respeito às diferenças! :o))
Abs,
Gui
Viva a liberdade de cada um para tomar o que, quando, onde e como quiser! Sem catequese! Abraços.
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